sábado, 15 de agosto de 2009

11 - Ondas Azuis

cont...

Realmente, os verdes mares do Ceará não estavam pra peixe (nem para pisciana). Com aqueles movimentos incontroláveis Lia se sentia uma personagem de teatro de boneco manipulada por um bonequeiro amador. As reuniões da APC começavam a ser estressantes. Era preciso estar o tempo todo lembrando às cuidadoras/cuidadores que o Parkinson é uma enfermidade neurológica, não necessariamente uma deficiência mental. Pelo menos não era o caso dos associados da Associação Parkinson do Ceará.

Lia se incomodava ao ver como as mulheres – esposas e ou filhas – de parkinsonianos os tratavam; como se fossem imbecis, quase dementes, incapazes (entre coisas) de se servirem dos salgadinhos que a tesoureira insistia em vender para o grupo a cada reunião. [Queiram, por favor, me perdoar por palavras tão pesadas, e pela lembrança dos salgadinhos da tesoureira].

Nós, os Pks, ironizava Lia, não tínhamos tempo nem espaço para falarmos entre nós durante as reuniões. O(a) cuidador(a) sempre respondia as perguntas feitas, até pelo médico, ao (seu !?) Pk.

Durante muito tempo Lia se culpou pela falta de lucidez e inteligência para contornar as intrigas que se tornaram constantes. Ela queria a APC como espaço para troca de experiências (e dores) entre Pks, um espaço para discutirem as dificuldades nas relações familiares, profissional, social e afetiva, para aprender a conviver com o preconceito de que são vítimas.

Entretanto, esses objetivos foram decompostos pela vaidade e irresponsabilidade de algumas cuidadoras. Essas ignoravam ou não se preocupavam com os benefícios de uma vida social ativa do pk, nem percebiam a importância da inclusão social na promoção da autoestima. De uma forma ou de outra, reproduziam o preconceito exibido por não raras famílias que se envergonham de mostrar seu parente portador de Parkinson, condenando-os a viver numa solidão exasperante.

Lia hesitou muito em revelar essa página de sua história, mas como se propôs a narrar sua experiência pós Parkinson, essa relação conflituosa com algumas pessoas da APC não pôde ser evitada, não pode ser descartada. Faz parte.

Entretanto, isto é um blog, lembra Lia: posso deletá-lo assim que meu coração se livrar da indignação. O que não deve demorar muito mais porque este desabafo literário tem me ajudado a superar a profunda insegurança que me move (ou moveu) por mais de 10 anos. Era um odioso círculo vicioso. Quanto mais problemas na Associação (e altas doses de L-dopa) mais discinesia, quanto mais movimentos involuntários, mais inaceitável era meu posto de presidente. Até que....continua na Onda 12, OK?

wilmamonteiro@terra.com.br

cont.

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